ALMAS GÊMEAS
– Oi! Tudo bem?
– Tudo tranqüilo, e aí?
– Eu estava louca para conversar com você de novo, ontem nosso papo foi muito bom...
– É verdade, há um mês eu entrei no bate-papo meio por entrar e de repente...
– De repente?
– De repente, encontro uma Maria, com a qual sonhei a vida inteira.
– Verdade mesmo? Você está falando sério?
– Falando sério? Você nem imagina quanto! Nas nossas conversas rápidas, eu senti assim
uma premonição de que ali estava, finalmente, a minha alma gêmea.
– Agora você me deixou emocionada... Mas, na verdade, eu também senti uma coisa meio
diferente e hoje mais ainda, neste nosso início de bate-papo. Sabe de uma coisa, João? Até
parece que eu te conheço de uma vida inteira.
– E eu, Maria? Desde outras vidas, tamanha é a afinidade que eu sinto por você.
– Que bonito, João. Assim é covardia, esta batalha você ganhou.
– Ganhei nada, sou desde já refém da sua simpatia, seu jeito, sua forma de expressar...
– Obrigada, João.
– Nem agradeça, Maria. Vamos conversar mais, quero saber tudo de você. Quem é você?
– Adivinha, se gostas de mim...
– Quem é você, minha misteriosa?
– Eu sou Colombina.
– Eu sou Pierrot. Mas nem é carnaval, nem meu tempo passou. Bom, pelo menos depois de
você.
– É verdade, João. Deixando a música de lado, eu que já não sou tão menina, apesar de
estar me sentindo assim, quero que você saiba que a minha vida estava muito chata, muito
monótona até que o destino te colocou neste diálogo meio louco, meio mágico...
– Vamos fazer o jogo da verdade, Maria? Eu sou João, ou outro nome qualquer, tenho 45
anos, casado há muito tempo, sem filhos. Meu casamento entrou numa rotina...
– Eu também, João, estou casada há muito tempo, também sem filhos, achando que era
feliz, até te descobrir, e, principalmente, descobrir que estou viva. Apesar de também ter
passado dos quarenta, estou me sentindo uma colegial, diante das primeiras emoções.
– A minha esposa é boazinha, mas não tem a mínima imaginação, nem a tua sensibilidade.
Jamais seria capaz de um diálogo deste nível.
– O meu marido é honesto, trabalhador, mas é um tremendo cretino, só pensa em futebol.
– Eu até gosto de futebol, mas não sou muito fanático. A minha mulher só quer saber
daquelas novelas chatas, sempre do mesmo jeito.
– Eu quase que nem assisto novelas, prefiro ler e conversar. Com pessoas como você, é
claro!
– Pois é… este papo de internauta é gostoso, mas já não me satisfaz plenamente. Eu quero
te conhecer pessoalmente, tocar no teu corpo. E quem sabe...
– Eu fico meio envergonhada… Mas, dane-se o pudor, estou louca para fazer com você as
coisas mais loucas que puder...
– Que tal neste fim de semana, à tarde… a gente poderia ir a um barzinho...
– Eu topo!!!
– Me deixa o número do seu celular…
– Ah! É 9899...
– 9899... Mas este é o celular da minha esposa!!! É você, Joana???
– José?!!!!
Autor: Luiz Fernando Elias é cardiologista e, nas horas vagas, cronista.
.(Como leitores, ao iniciarmos a interação com o autor por meio
do texto, situamos a história no seguinte quadro: um homem e uma
mulher estão em um bate-papo de internet e, geralmente, como é
esperado nessa situação, comportam-se como dois desconhecidos.)
domingo, 4 de março de 2012
VIDE BULA
VIDE BULA
Há cerca de 10 anos publiquei este artigo no Jornal de Cajuru, num momento especial para o
país, quando o esquema colorido havia sido desmantelado, e havia grandes expectativas
quanto ao futuro político do Brasil.
Hoje aproveito para republicá-lo, como prévia para o Vide Bula II, que certamente trará novos
medicamentos, para quem sabe, desta vez, curar o paciente. Uma coisa é certa: este já não
está mais na UTI. Concordam?
O Brasil está doente. Êta frasezinha batida! Todo mundo está cansado de saber disso. O
diabo é: qual remédio?
Muito se tem tentado com drogas tradicionais, ou novidades, porém até agora nenhuma teve
o tão almejado efeito de curar este pobre enfermo.
Há bem pouco tempo foi tentada uma droga novíssima, quase não testada, mas que
prometia sucesso total, a “Collorcaína”, que, infelizmente, na prática de nada serviu, seus
efeitos colaterais extremamente deletérios (como a liberação da “Pecelidona”) quase acaba
com o doente.
Porém, para o ano que vem, novos medicamentos poderão ser usados. Enquanto isso não
acontece, o doente consegue se manter com doses de “Itamarina” que é uma espécie de
emplastro que, se não cura, também não mata.
Mas, voltando ao ano que vem, se é que podemos voltar ao futuro, vamos estudar os
possíveis medicamentos que teremos à disposição do moribundo.
A primeira droga a ser discutida já é uma antiga que estava em desuso e voltou com nova
embalagem e novas indicações, podendo ser eficaz no momento.
Trata-se da “Paumalufina”, extraída do pau-brasil com a propriedade de promover perda das
gorduras, principalmente estatais, acentuando a livre iniciativa. Tem como efeito colateral a
crise aguda de autoritarismo e também de perdularismo, sendo contra-indicada para as
democracias.
A segunda droga, também já testada, é derivada da “Pemedebona”, a “Orestequercina”, que
atua em praticamente todos os órgãos, que passam a funcionar somente às custas da
“Desoxidopropinainterferase”, que promove um desempenho muito mais fisiológico.
Esta droga tem como efeito colateral uma grande depleção das reservas, depleção esta que
pode ser fatal ao organismo.
Mais recentemente foi criada a “L.A. Fleurizina”. Derivada da “Orestequercina”, age de
maneira muito semelhante à mesma, sendo, entretanto, muito mais contundente e agressiva.
É formalmente contra-indicada para Carandirus e professores.
A terceira droga do nosso tratado é uma ainda não testada, mas já com fama de eficiência.
Trata-se do “Cloridrato de Lulalá”, derivada da “Estrelapetina”, e, como efeito, promete
revitalizar as células periféricas, tornando-as tão importantes quanto as do SNC ( Sistema
Nervoso Central).
É importante lembrar que a mesma pode causar imobilismo com liberação de seitas e
dissidências. Tais efeitos colaterais podem ser evitados com injeção na veia de
“antisectarina” e cápsulas de “Bonsensol”.
Ainda é bom lembrar que o uso de tal substância provoca uma cor avermelhada em todos os
órgãos.
A quarta droga que discutiremos é a “Tucanina Cacicóide”, na verdade, um complexo de
inúmeros componentes, como a “F.H.Cardozina”, a “Zesserrinitrina”, a “Mariocovase” e
muitas outras mais que são muito eficientes “In Vitro”, porém sem comprovação de efeito “In
Vivo”.
Seu maior efeito colateral é a interação de seus componentes que competem entre si,
causando uma síndrome chamada “encimamurismo”, síndrome esta extremamente deletéria
e que pode invibializar o uso de tal medicamento.
Existem ainda drogas menores como a “Brizolonina” que, quando aplicada, provoca intensa
verborragia e manias perseguitórias.
Há ainda a A.C. Malvadezina, uma droga extremamente tóxica que causa náuseas até em
quem aplica.
Terminando nosso estudo, esperamos que, desta vez, os médicos saibam o remédio certo
para salvar o doente
Autor: Luiz Fernando Elias é cardiologista e, nas horas vagas, cronista
(Esses fatores referem-se a conhecimento dos elementos
lingüísticos (uso de determinadas expressões, léxico antigo
etc.), esquemas cognitivos, bagagem cultural, circunstâncias em
que o texto foi produzido.)
Há cerca de 10 anos publiquei este artigo no Jornal de Cajuru, num momento especial para o
país, quando o esquema colorido havia sido desmantelado, e havia grandes expectativas
quanto ao futuro político do Brasil.
Hoje aproveito para republicá-lo, como prévia para o Vide Bula II, que certamente trará novos
medicamentos, para quem sabe, desta vez, curar o paciente. Uma coisa é certa: este já não
está mais na UTI. Concordam?
O Brasil está doente. Êta frasezinha batida! Todo mundo está cansado de saber disso. O
diabo é: qual remédio?
Muito se tem tentado com drogas tradicionais, ou novidades, porém até agora nenhuma teve
o tão almejado efeito de curar este pobre enfermo.
Há bem pouco tempo foi tentada uma droga novíssima, quase não testada, mas que
prometia sucesso total, a “Collorcaína”, que, infelizmente, na prática de nada serviu, seus
efeitos colaterais extremamente deletérios (como a liberação da “Pecelidona”) quase acaba
com o doente.
Porém, para o ano que vem, novos medicamentos poderão ser usados. Enquanto isso não
acontece, o doente consegue se manter com doses de “Itamarina” que é uma espécie de
emplastro que, se não cura, também não mata.
Mas, voltando ao ano que vem, se é que podemos voltar ao futuro, vamos estudar os
possíveis medicamentos que teremos à disposição do moribundo.
A primeira droga a ser discutida já é uma antiga que estava em desuso e voltou com nova
embalagem e novas indicações, podendo ser eficaz no momento.
Trata-se da “Paumalufina”, extraída do pau-brasil com a propriedade de promover perda das
gorduras, principalmente estatais, acentuando a livre iniciativa. Tem como efeito colateral a
crise aguda de autoritarismo e também de perdularismo, sendo contra-indicada para as
democracias.
A segunda droga, também já testada, é derivada da “Pemedebona”, a “Orestequercina”, que
atua em praticamente todos os órgãos, que passam a funcionar somente às custas da
“Desoxidopropinainterferase”, que promove um desempenho muito mais fisiológico.
Esta droga tem como efeito colateral uma grande depleção das reservas, depleção esta que
pode ser fatal ao organismo.
Mais recentemente foi criada a “L.A. Fleurizina”. Derivada da “Orestequercina”, age de
maneira muito semelhante à mesma, sendo, entretanto, muito mais contundente e agressiva.
É formalmente contra-indicada para Carandirus e professores.
A terceira droga do nosso tratado é uma ainda não testada, mas já com fama de eficiência.
Trata-se do “Cloridrato de Lulalá”, derivada da “Estrelapetina”, e, como efeito, promete
revitalizar as células periféricas, tornando-as tão importantes quanto as do SNC ( Sistema
Nervoso Central).
É importante lembrar que a mesma pode causar imobilismo com liberação de seitas e
dissidências. Tais efeitos colaterais podem ser evitados com injeção na veia de
“antisectarina” e cápsulas de “Bonsensol”.
Ainda é bom lembrar que o uso de tal substância provoca uma cor avermelhada em todos os
órgãos.
A quarta droga que discutiremos é a “Tucanina Cacicóide”, na verdade, um complexo de
inúmeros componentes, como a “F.H.Cardozina”, a “Zesserrinitrina”, a “Mariocovase” e
muitas outras mais que são muito eficientes “In Vitro”, porém sem comprovação de efeito “In
Vivo”.
Seu maior efeito colateral é a interação de seus componentes que competem entre si,
causando uma síndrome chamada “encimamurismo”, síndrome esta extremamente deletéria
e que pode invibializar o uso de tal medicamento.
Existem ainda drogas menores como a “Brizolonina” que, quando aplicada, provoca intensa
verborragia e manias perseguitórias.
Há ainda a A.C. Malvadezina, uma droga extremamente tóxica que causa náuseas até em
quem aplica.
Terminando nosso estudo, esperamos que, desta vez, os médicos saibam o remédio certo
para salvar o doente
Autor: Luiz Fernando Elias é cardiologista e, nas horas vagas, cronista
(Esses fatores referem-se a conhecimento dos elementos
lingüísticos (uso de determinadas expressões, léxico antigo
etc.), esquemas cognitivos, bagagem cultural, circunstâncias em
que o texto foi produzido.)
Fui a Cachaçaria
Fui à Água Doce Cachaçaria e tomei uma cachaça da boa, mas tão boa que resolvi levar dez
garrafas para casa, mas Dona Patroa me obrigou a jogar tudo fora.
Peguei a primeira garrafa, bebi um copo e joguei o resto na pia.
Peguei a segunda garrafa, bebi outro copo e joguei o resto na pia.
Peguei a terceira garrafa, bebi o resto e joguei o copo na pia.
Peguei a quarta garrafa, bebi na pia e joguei o resto no copo.
Peguei o quinto copo, joguei a rolha na pia e bebi a garrafa.
Peguei a sexta pia, bebi a garrafa e joguei o copo no resto.
A sétima garrafa eu peguei no resto e bebi a pia.
Peguei no copo, bebi no resto e joguei a pia na oitava garrafa.
Joguei a nona pia no copo, peguei na garrafa e bebi o resto.
O décimo copo, eu peguei a garrafa no resto e me joguei na pia.
Não me lembro do que fiz com a Patroa!
(A orientação do autor é de outra natureza. Observemos: até a
quinta linha o texto progride sem “estranhamento”. Da sexta
linha em diante, a disposição dos termos na oração nos chama a
atenção por ser semanticamente inaceitável, segundo o nosso
conhecimento de mundo. Isso é uma pista importante para a
produção do sentido do texto, assinaladora da relação de
proporcionalidade: quanto mais o sujeito bebe, mais se embriaga;
quanto mais se embriaga, mais comete “incoerências” sintáticosemânticas)
Texto que está no Livro LER E COMPREENDER os sentidos do texto- Ingedore Villaça Koch
garrafas para casa, mas Dona Patroa me obrigou a jogar tudo fora.
Peguei a primeira garrafa, bebi um copo e joguei o resto na pia.
Peguei a segunda garrafa, bebi outro copo e joguei o resto na pia.
Peguei a terceira garrafa, bebi o resto e joguei o copo na pia.
Peguei a quarta garrafa, bebi na pia e joguei o resto no copo.
Peguei o quinto copo, joguei a rolha na pia e bebi a garrafa.
Peguei a sexta pia, bebi a garrafa e joguei o copo no resto.
A sétima garrafa eu peguei no resto e bebi a pia.
Peguei no copo, bebi no resto e joguei a pia na oitava garrafa.
Joguei a nona pia no copo, peguei na garrafa e bebi o resto.
O décimo copo, eu peguei a garrafa no resto e me joguei na pia.
Não me lembro do que fiz com a Patroa!
(A orientação do autor é de outra natureza. Observemos: até a
quinta linha o texto progride sem “estranhamento”. Da sexta
linha em diante, a disposição dos termos na oração nos chama a
atenção por ser semanticamente inaceitável, segundo o nosso
conhecimento de mundo. Isso é uma pista importante para a
produção do sentido do texto, assinaladora da relação de
proporcionalidade: quanto mais o sujeito bebe, mais se embriaga;
quanto mais se embriaga, mais comete “incoerências” sintáticosemânticas)
Texto que está no Livro LER E COMPREENDER os sentidos do texto- Ingedore Villaça Koch
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